Com a aprovação definitiva pela Câmara dos Deputados, a proposta de emenda à Constituição (PEC) da reforma tributária deve ser promulgada em uma cerimônia marcada para esta quarta-feira (20), segundo o presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL).
Envolta em controvérsias, a PEC teve a votação favorável à promulgação concluída após mais de oito horas de debates em plenário. O texto aprovado, um parecer do deputado federal Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), foi colocado em votação após reunião entre Lira e o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), que negociaram um acordo para sanar as principais divergências sobre o texto entre as Casas legislativas.
“Procuramos fazer o melhor possível para entregar ao Brasil um texto que dê longevidade, que dê mais simplicidade, que desburocratize, que dê segurança jurídica e que atraia investimentos ao Brasil”, disse o presidente da Câmara após a votação.
Prestes a ser incorporada pela Constituição, a PEC 45 foi protocolada em 2019 pelo deputado federal Baleia Rossi (MDB-SP) e idealizada pelo economista Bernard Appy, então diretor do Centro de Cidadania Fiscal (CCif) e hoje secretário especial para a Reforma Tributária do Ministério da Fazenda. Sua aprovação, considerada histórica, representa a primeira grande mudança no arcabouço tributário do país desde a década de 1960.
A promulgação do texto, no entanto, não encerra as discussões sobre a reforma. O Congresso ainda precisa analisar uma série de projetos de lei complementar que regulamentarão pontos específicos da PEC. O governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) deve encaminhar as propostas no primeiro semestre de 2024.
Os efeitos da aprovação da reforma também não serão sentidos de imediato. O prazo de transição para o novo modelo de tributação sobre o consumo começa apenas em 2026, e somente em 2033 o atual sistema será totalmente substituído pelo novo.
Confira a seguir os principais pontos para entender a reforma:
Imposto sobre Valor Agregado (IVA) dual
O eixo principal da reforma é a criação de um sistema de Imposto sobre Valor Agregado (IVA), modelo já adotado em 174 países. Isso significa que o recolhimento de tributos sobre bens e serviços passará a ser calculado apenas sobre o valor acrescido a uma mercadoria a cada elo da cadeia de produção, e não mais sobre o valor total do produto em cada etapa.
No modelo proposto, o IVA será dual, ou seja, composto de dois tributos: a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), de competência federal e que substitui os atuais PIS/Pasep e Cofins; e o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), cuja responsabilidade será compartilhada entre estados e municípios e que entra no lugar do ICMS e do ISS.
Simplificação da legislação tributária
A mudança simplifica a atual legislação tributária, hoje composta de milhares de leis que regem os atuais impostos sobre bens e serviços em cada município e cada unidade federativa do país, uma vez que as regras para o IBS serão uniformes em todo o Brasil.
No atual sistema de impostos, o Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação (IBPT) calcula que, desde a promulgação da Constituição de 1988, já foram editadas cerca de 466 mil normas tributárias, das quais 38 mil federais, 154 mil estaduais e 274 mil municipais. Isso significa que foram publicadas, em média, 54 conjuntos de regras tributárias por dia útil ao longo dos últimos 34 anos.
Não cumulatividade e cobrança no destino
Os impostos obedecerão ao princípio de não cumulatividade, o que significa que não haverá mais cobrança “em cascata”, ou tributação calculada sobre tributo. Cada etapa de produção será taxada sobre o valor adicionado ao bem ou serviço.
Outra mudança será o recolhimento do IBS no local de destino, o que, somado à legislação única para todo o país, deve acabar com a chamada “guerra fiscal” entre estados. Hoje, para atrair empresas a investirem em seus territórios, os governos estaduais se utilizam da concessão de benefícios tributários, o que gera desigualdade de concorrência e perda de arrecadação.
Maior alíquota do mundo
Como regra geral, a PEC prevê que alíquotas-padrão de CBS e ISS valerão para a maior parte dos bens e serviços. O relator do texto no Senado, Eduardo Braga (MDB-AM), incluiu uma trava para evitar o aumento da carga tributária total, por meio de uma revisão quinquenal das receitas com os impostos em relação ao Produto Interno Bruto (PIB). Na primeira revisão, prevista para 2030, caso os resultados de 2027 e 2028 sejam superiores à média observada entre 2012 e 2021, as alíquotas devem ser reduzidas.
O próprio ministro da Fazenda, Fernando Haddad, calcula que, somadas, as alíquotas de referência dos dois tributos devem chegar a 27,5%, o que colocaria o IVA brasileiro como o mais alto do mundo, superando o da Hungria, de 27%, e pelo menos 70% acima da média mundial e da alíquota mais adotada internacionalmente.
Nas projeções de analistas independentes, no entanto, o imposto pode ser ainda maior. O economista-chefe da Warren Rena e ex-secretário da Fazenda de São Paulo, Felipe Salto, por exemplo, calcula que o patamar pode chegar a 33,5%. O porcentual que será cobrado em cada um dos tributos ainda será definido por meio de lei complementar que regulamentará a CBS e o IBS.
Por Célio Yano (Gazeta do Povo)