Era necessária uma reforma tributária e ela foi aprovada, mas a grande força não veio da luta política e sim da liberação de emendas de montante que supera os 5 bilhões de reais. Logo, está longe de reparar desigualdades e sim para oxigenar estados e um governo federal que gastará muito e de forma nada republicana. Embora o presidente Lula seja beneficiado, o grande vitorioso é o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), que liderou as 'negociações' que levaram à aprovação da reforma. O líder parlamentar, que muitos chamam de presidente efetivo, emergiu como grande vencedor da aprovação da reforma tributária pela Casa na noite de quinta-feira (6), que ocorreu com rapidez e ampla margem de votos: 382 a favor, bem acima dos 308 necessários e além das expectativas
Indubitavelmente o presidente Luiz Inácio Lula da Silva deixou de aproveitar politicamente a aprovação da reforma tributária ao se abster de liderar o processo, terceirizando aos outros, perdendo os méritos para o presidente da Câmara, Arthur Lira e o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, com um protagonismo do governador Tarcísio de Freitas, mesmo contrariando Jair Bolsonaro.
Entretanto, é fato que Lula encerra bem o primeiro semestre e pode verbalizar a sua história de que logrou aprovar uma reforma muito mais desafiadora que qualquer outro tema. Lula que hora zomba do socialismo ou como disse ao 'Estadão' que "era um socialista moderno que defende mesmo é a empresa privada", permite agora que carros acima de 300 mil, elétricos não paguem Ipva, enquanto carros mais usados pagam. A reforma concentra poder no governo central e está longe de distribuir renda.
A esquerda que ele abandonou faz tempo cravou total oposição. O líder do PSTU ex-deputado petista, Cyro Garcia, denunciou que " a política econômica do governo Lula beneficia os ricos", já o maior nome comunista do país, acadêmico pernambucano Jonas Manoel (PCB), foi ainda mais direto e pessoal, "o Lula está acostumado a uma safadeza de não querer ser questionado, ele não é Deus". Comunistas (PCV) que são perseguidos pelo aliado de Lula na Venezuela, o presidente Nicolás Maduro. Já o ex-candidato ao senado e dirigente da 'Unidade Popular', Raul Bittencourt, mira de forma mais ampla sua insatisfação: "Parar o retrocesso nas pautas de costumes não é suficiente. Precisamos, através da mobilização popular, reverter anos de reformas liberais no Estado e nos direitos sociais. Não bastam esses frágeis acordos de coxia, pois só o povo organizado produz transformações duradouras e é capaz de derrotar o fascismo". A reforma de fato avança pouco na equiparação das diferenças no país, está mais para a Faria Lima que para os trabalhadores brasileiros.
O protagonismo coube a Arthur Lira, pois ele liderou o processo diretamente e com livre autorização de 'promessas', enfrentando embates diretos e deixando a sua marca pessoal nele. É por isso que nos corredores da política ele é tratado como dono do orçamento e do governo, Lira se torna então uma figura de importância equivalente à de Lula na República. O Brasil tem dois mandatários efetivamente. Lira consolidou o seu poder ao obter êxito como principal articulador, superando as resistências de governadores, setores produtivos e líderes partidários. Chegou a ameaçar líderes políticos de um futuro 'isolamento', usando como peso maior, a caneta que forçou Lula a incorrer na liberação por parte do governo de R$ 5,3 bilhões em emendas parlamentares horas antes da votação. As fraudes descobertas no futuro estão sendo realizadas neste presente.
Lira conquistou apoios importantes para a PEC, deixando políticos de peso temerosos de sofrer isolamento. Ele se destacou ao mediar as discussões e ao moldar desfechos. Sua atuação levou muitos a ceder e negociar, reconhecendo o risco iminente da aprovação da reforma. Além disso, Lira foi à tribuna do plenário para enfatizar a importância do debate técnico, pedindo aos deputados que abandonassem posições ideológicas e a disputa entre oposição e situação. Arrematou na nesta sexta a responsabilidade para si, chamando como Câmara: “Neste esforço legislativo, na noite de ontem (7/7), num fato histórico, na primeira grande reforma estruturante tributária no país depois da redemocratização, a Câmara dos Deputados cumpriu o seu papel”. No plenário Lira é legislativo e executivo determinando que caminhos são possíveis. Em nova vitória nesta sexta, a Câmara aprovou a volta do voto de qualidade do Carf para alívio de Haddad. Medida era tratada como prioridade pelo Ministério da Fazenda para dar sustentabilidade ao arcabouço fiscal
Oficialmente a PEC cria o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) para unificar o ICMS (estadual) e o ISS (municipal) e a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) para reunir os impostos federais PIS, PIS-Importação, Cofins e Cofins-Importação. O Conselho Federativo administrará o IBS. Em vitória de Tarcísio (Republicanos), o relator atendeu às demandas de governadores, liderados pelo governador de São Paulo, para aprimorar a composição e a rotina do colegiado e a gestão do Fundo de Desenvolvimento Regional (FDR), que terá recursos até R$ 40 bilhões. O governador de São Paulo olhou os benefícios da reforma e colocou uma independência política em relação à parcela da direita mais ligada a Bolsonaro. O ex-presidente foi derrotado, apesar do senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) afirmar que não houve briga entre seu pai e o governador Tarcísio. Ainda coube uma indireta de Ciro Nogueira para Bolsonaro,"nenhuma oposição pode ser contra o Brasil", disse o senador e ex-ministro da Casa Civil, horas após a aprovação da reforma tributária na Câmara
Enquanto o poder se reunia, a realidade bradava. O Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) divulgou que as queimadas no Brasil nos primeiros seis meses do governo Lula tinham crescido 10 %, em relação ao mesmo período de 2022, foram registrados 8,3 mil focos de incêndio nos 180 dias de 2023 ante 7,5 mil no ano passado. Só para o mês de junho na Amazônia foram 3,1 mil com aumento de 20% frente ao mesmo mês do ano passado. O maior em 16 anos. Em que mundo vivem nossos dois presidentes?
Por Túlio Ribeiro